sábado, 17 de novembro de 2012

O Porque do Nome Lampião - Baú de Estória ; Paulo Moura


VIRGULINO, VULGO: LAMPIÃO

Durante um tiroteio nas imediações de Mata Grande/Alagoas, contra uma volante da força alagoana onde o alvo principal seria o tenente Lucena, acontece um episódio interessante que termina entrando para a história do cangaço. Já era noite e o grupo atirava sem parar. Um cangaceiro que lutava próximo a Virgulino deixou o cigarro de palha cair no chão. Como estava escuro esse companheiro não conseguia localizar onde havia caído o cigarro.
- Caiu o cigarro e não consigo encontrar. – disse ele a Virgulino.
- Vou atirar e, no clarão, vosmicê procura o cigarro. O cangaceiro atirava com tanta rapidez que o companheiro pilheriou para os demais:
- Vôte homi, inté parece um “lampião”!
- Acende lampião, acende lampião! Dizia Virgulino dando risadas.
Desde esse dia o seu apelido passou a ser “Lampião”, devido à rapidez com que manuseava o rifle. Esta, entre tantas outras, é uma das versões correntes de como Virgulino adotou o codinome Lampião. Anos depois, fazendo alusão à sua arma, Virgulino soltou estas loas numa roda de amigos:
“Meu rifle é o de dez tiros,
Desse da boca amarrada
Cruzeta do ponto branco
D’argolinha pendurada,
Cano de aço legítimo,
Da culatra reforçada. “
Naqueles tempos, de completo abandono e um crescente surto de violência no Sertão, seja da parte dos cangaceiros, seja da polícia, o nome de Lampião se fez ecoar nos quatro cantos da região.
Seu simples pronunciamento já causava pavor e medo. Não existia, com raríssimas excessões, valente para peitá-lo. Não havia coronel, poderoso e forte, a ponto de não temê-lo.
A polícia recuava, outros bandos se uniam a ele, o coronel cedia e o povo, de um modo geral, respeitava sua força e coragem. No íntimo, queriam ser como ele: destemido, valente e determinado.
Lampião não temia a morte.
Desprezava a vida.
Encarnou a justiça à sua maneira e, também a seu modo, governou o Sertão. Tudo o que aplicou nessa nova profissão aprendera com o grande Sinhô Pereira, homem de família nobre, honrado e educado.
No mais, tinha grandes dotes de inteligência e um enorme espírito de liderança. Prova disto é o simples fato de ser ele, por exemplo, o mais novo dos três irmãos que entraram inicialmente para o cangaço e ter para sí a responsabilidade de comandar seu bando, que antes era comandado pelo irmão mais velho Antonio. A propósito, quando o Sinhô Pereira resolveu abandonar o cangaço passou a coroa e as responsabilidades, que não deviam ser poucas, da manutenção de um grupo, para ele. Lampião, de tão inteligente que foi, resolveu logo subdividir estes grupos em sub-grupos, – coisa que cangaceiro nenhum havia pensado antes – , para, assim, aumentar seu raio de ação e reduzir os gastos do seu bando.
A única coisa negativa nessa sua idéia foi o fato de, estando os grupos dispersos atuando cada qual na sua área, frequentemente os crimes praticados por qualquer um deles era, de pronto, atribuidos ao grupo de Lampião. A exemplo do ataque à cidade de Souza/PB, onde Livino e Sabino cercaram e depredaram a mesma e, posteriormente, os jornais noticiaram que Lampião havia invadido a cidade, enquanto este convalescia de um tiro que esfacelou-lhe o tornozelo. Muitos estupros, mortes e desatinos foram praticados por cangaceiros vários e de grupos variados, mas, sendo sub grupo do chefe, o crime era atribuido a este.
Suas táticas de terror, artificios que o transformaram em mito, aprendeu com a vida e sabia que necessitava usá-las da melhor forma possível. Pois para ele, era essa a única linguagem que aquele povo, infelizmente, tão pobre e inculto, entendia. 
E era esta linguagem que a polícia e os potentados da época, leia-se coronéis e políticos, usavam para toda e qualquer pessoa que lhe caisse nas garras. Neste mesmo período, por volta de 1922/1925, o governo da Paraíba precisou intervir junto ao poder Pernambucano a respeito das ações da polícia deste segundo estado que, na caça aos cangaceiros praticavam toda a sorte de maltratos à população indefesa nas zonas rurais.
Não vamos pensar que assassinatos, estupros, degolas, sangramentos, surras, torturas, etc, eram obra apenas de cangaceiros. Esses tipos de artifícios eram coisas comuns ( ! )  de se praticar naquele mundo seco e perdido, onde travava-se uma guerra de titãs, quando duas facções se cruzavam.
O valente militar Mané Neto, por exemplo, era um dos mais terríveis torturadores da polícia. A população Paraibana, Baiana e mesmo a pernambucana, conheceram o peso de sua autoridade. A presença do valente Mané Neto numa batalha já era por sí só, motivo para fazer tremer o mais valente cangaceiro.
E não era porque poderia ser morto por este, mas porque poderia ser “pego” por ele e, assim, torturado das formas mais horrendas possíveis.
O proprio Lampião afirmava aos seus que, “se Mané Neto chegou, precurem sarvá  a metade da vida que a outra já foi!”.  
“…Quando integrava o bando
Do chefe Sinhô Pereira
Virgulino batalhava
Junto com a cabroeira
Era noite, tava escuro,
E seu compadre “Pé duro”
Lhe falou desta maneira:
- Compadre o meu cigarro
Desprendeu da minha boca,
E eu não consigo encontrá-lo
Pois a claridade é pouca,
Você me ajude a achá-lo
Pois agora, de fumá-lo
Me deu uma vontade louca!
- Compadre não se avexe
Que a gente vai encontrar
O seu paisano de palha
Se abaixe pra procurar
Eu vou, com meu mosquetão
Fazer aqui um clarão
Pra mode o senhor achar!
Virgulino com destreza
Apontou o mosquetão
Descarregando no piso
Toda sua munição.
De perto a cangaceirada
Gritava entusiasmada:
– Te acende Lampião!!!!
O matuto encontrou
O seu cigarro perdido
E Virgulino ganhou
Neste dia um apelido…
Morreu nesse dia então
Virgulino, o cidadão,
Nasceu Lampião, o bandido…”
Extraído do livro “ Lampião, a Trajetória de um Rei sem Castelo” – Autor Paulo Moura – Editora Espaço Idéa. São Paulo/SP. Editora ASNAI. Recife/PE – 2008. 1ª Edição

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