domingo, 28 de outubro de 2012

Pra não Dizer Que não falei do MENSALÃO ; Autor Marcos Mairton - Juiz Federal de Ceará e Poeta



PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE MENSALÃO

Com o julgamento do processo do Mensalão, palavras até pouco tempo restritas ao mundo jurídico chegaram ao público em geral. Expressões como “prescrição”, “competência”, “impedimento” e “sustentação oral”, nem sempre de fácil apreensão por quem não respira o ar dos corredores forenses, são cada vez mais lidas e ouvidas.
E não foram só as expressões jurídicas que passaram a chamar a atenção. O mesmo tem acontecido com o método de trabalho dos juízes, o processo de escolha dos Ministros do Supremo, as estratégias do Ministério Público e dos advogados de defesa, e tantas outras juridicalidades (acho que essa é nova) que se tornaram tema de noticiários e de comentários de articulistas famosos.
Ocorre que, exatamente por não serem habituadas às expressões e aos mecanismos do mundo juridico, muitas pessoas alternam sentimentos que vão da apreensão à perplexidade e acabam desistindo de tentar entender os acontecimentos. O fato ocorre inclusive com pessoas cultas e bem informadas. Para algumas destas, dizer que o que está acontecendo no STF é apenas um jogo de faz de conta, e que tudo já estaria previamente decidido, pode parecer uma desculpa razoável para ficar distante das incômodas questões jurídicas.
Mas, será que deveria ser assim? Afinal, o Direito regula desde o modo como dirigimos um carro até o quanto se pode desmatar da mata nativa em uma propriedade rural. É por meio do Direito que se definem como os tributos são cobrados, quais condutas são definidas como crime e as regras para as eleições. Por que então a maioria das pessoas fica tão desconfortável diante de temas jurídicos?
Reconheço que nós, profissionais do Direito, contribuímos para esse afastamento, nos comunicando muitas vezes através do chamado “juridiquês”, mas, será que é essa a verdadeira causa da pouca difusão do conhecimento jurídico? É curioso ver como até jornalistas que cobrem julgamentos demonstram insegurança. Não que devessem ser especialistas no assunto, mas conhecer o essencial ajudaria a dar informações mais claras ao público.
Penso nisso e lembro de um trabalho que vi meu filho fazendo outro dia para a escola. Ele estudava a célula e falava de citoplasma, mitocôndrias e outras partes minúsculas do nosso corpo. Acho importante que ele estude essas coisas. Mas por que nossos jovens não estudam igualmente as células que compõem a estrutura orgânica do país?
Alguém poderia me dizer se nas escolas os jovens estão aprendendo algo sobre a função dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário? Se está sendo dito que a existência de Estados e Municípios no Brasil tem relação com o fato de o país ser uma República Federativa? Pois se nossos jovens tornam-se adultos sem saber as diferenças e semelhanças entre um Promotor de Justiça e um Procurador da República, como esperar que esses adultos entendam a existência de recursos das decisões judiciais?
Reflito sobre essas coisas e pergunto-me se não seria o caso de se levar à escola aulas sobre cidadania, instituições, direitos, deveres… Sim, deveres! Seria importante nossas crianças crescerem ouvindo falar sobre os deveres dos cidadãos, sobre as leis e a necessidade de respeito a elas.
Não defendo que ao concluir o ensino médio cada brasileiro fosse um bacharel em Direito, mas acredito que conhecimentos básicos de Direito e Ciência Política deveriam ser difundidos entre as pessoas desde a pré-adolescência. Acredito que, assim, quando houvesse um julgamento como o do Mensalão, muito mais gente poderia compreender os acontecimentos e ter uma postura crítica em relação a eles.
Aliás, permitindo-me certo otimismo, acredito que, se esses conhecimentos nos fossem transmitidos desde cedo, teríamos melhores chances de fiscalizar os nossos representantes, evitando que casos de corrupção e desvio de dinheiro público fossem tão recorrentes no Brasil

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